Adriana Calcanhotto: “Viver sem música alguma pode ser triste e empobrecer o espírito.” (Entrevista 2004)
Adriana Calcanhotto, cantora, compositora, intérprete, instrumentista, produtora musical, arranjadora, escritora e ilustradora brasileira, concede entrevista para o Saude e conta sobre sua infância, inspirações e explica quem é Adriana Partimpim
Nascida em Porto Alegre, a cantora e compositora Adriana Calcanhotto surgiu no cenário da Música Popular Brasileira no final dos anos 80 e, hoje, é considerada uma das maiores intérpretes brasileiras, além de uma compositora de talento. Compondo e cantando cada vez melhor, a gaúcha escolheu o Rio de Janeiro para lançar o seu primeiro disco, “Enguiço”, em 1990. A estréia dividiu os críticos: alguns a comparavam com a também gaúcha Elis Regina, mas a apontavam como uma das grandes revelações para a década de 90; outros achavam que se tratava de uma euforia passageira. A comparação com Elis foi inevitável e natural, mas hoje ninguém mais faz.
A marca pessoal da cantora se revelou mais ainda a partir de “Senhas” (1992), interpretando composições de sua autoria e que se tornaram grandes sucessos, como Mentiras e Esquadros. Ainda neste disco, Adriana regravou a música O Nome da Cidade, de Caetano Veloso. Bem à vontade e já adaptada ao Rio, pode-se dizer que a cidade serviu de inspiração para compor, brilhantemente, Cariocas. Assim diz a canção: “Cariocas são espertos/ cariocas são diretos/ cariocas não gostam de dias nublados.”
Depois de sucessos como Vambora, Metade e Inverno, entre outros, Adriana lançou recentemente o seu sétimo disco, “Adriana Partimpim” (BMG, 2004). O novo CD traz composições de Paula Toller (Oito Anos), Péricles Cavalcanti (Ser de Sagitário), Arnaldo Antunes (Saiba), Edu Lobo e Chico Buarque (Ciranda da Bailarina), além do último sucesso da dupla de funk Claudinho & Buchecha (Fico Assim sem Você). A voz doce de Adriana entoa belas canções do universo adulto que podem, sim, ter uma leitura infantil. Como diz a cantora, o disco tem classificação livre.
Calcanhotto e Partimpim são duas pessoas diferentes, porém há em comum entre elas o gosto pela simplicidade, pela clareza e pelo humor. “Adriana Partimpim” é o nome que a cantora criou para si própria na infância e até hoje seu pai a chama assim. Ela acredita que com este heterônimo fica mais fácil produzir novos discos como este último.
Em entrevista exclusiva ao portal saude.com.br, Adriana Calcanhotto (ou Partimpim?) conta como e quando surgiu a ideia de gravar o CD, fala dos públicos nacional e internacional e do que gosta de fazer nas horas de lazer, além de sua relação com os animais. A cantora cria cinco cachorros e três gatos em sua casa, no Alto da Boa Vista (Rio de Janeiro). “Bichos não fazem julgamentos”, revela.
Você cita em seu site o artista francês Henri Matisse, que dizia que o artista jamais deve ser prisioneiro de si mesmo, prisioneiro do estilo. Foi pensando nisso que surgiu a ideia de renovar e gravar o disco?
Adriana Calcanhotto: Não, a ideia de fazer o CD nasceu muito antes de eu me deparar com o texto do Matisse, em 1994, logo depois das gravações do meu terceiro CD, “A fábrica do poema”. A ideia foi evoluindo e muito tempo depois, já na finalização do projeto, encontrei o texto do Matisse do qual Waly Salomão já havia me falado. É uma ideia encantadora essa dos artistas japoneses do Grande Período, de trocarem seus nomes para não acumularem resíduos do passado, para livrarem-se da reputação adquirida, para, como diz Matisse, “salvaguardar as suas liberdades”. Logo que surgiu a ideia de fazer o disco, eu sabia que ele se chamaria “Adriana Partimpim”, que é o nome que inventei para mim quando era criança. Foi depois, já na finalização do CD, que resolvi trocar de nome, ou melhor, resolvi assumi-lo como um heterônimo porque acredito que isso viabilize o meu desejo de gravar mais discos desse tipo. Então, Adriana Calcanhotto tem uma discografia e Adriana Partimpim terá outra.
O disco Partimpim pode ser considerado um disco infantil?
AC: Pode, mas não exclusivamente. Eu prefiro chamá-lo de CD de “Classificação Livre”.
Como o novo cd foi recebido pelos fãs, basicamente jovens e adultos?
AC: A recepção tem sido muito boa e incrivelmente direta. Pessoas bem mais velhas também têm gostado muito, tenho ouvido histórias lindas a respeito do disco na vida das pessoas, jovens ou não.
Como foi o processo de seleção das músicas?
AC: Levei dez anos trabalhando nesse projeto e as músicas foram aparecendo cada uma de um jeito, cada uma a seu tempo, durante todo esse período. Obviamente, algumas canções ficaram de fora, mas como a ideia sempre foi a de fazer vários discos, não fiquei muito triste de cortá-las. Posso gravá-las depois.
O que difere a Adriana Partimpim de Adriana Calcanhotto? E o que as duas têm em comum?
AC: A diferença é que sobre a Adriana Partimpim não há expectativa, então ela pode inventar as coisas e se auto-inventar do jeito que quiser, tem grande liberdade para fazer isso, não há necessidade de coerência. O que existe em comum entre elas é o gosto pela simplicidade, pela clareza e pelo humor.
Ao longo de sua carreira tem dado para notar a diferença entre os públicos no Brasil?
AC: É difícil precisar, os públicos são diferentes a cada noite, em cada lugar do mundo. A cada show existe uma química única, com aquela platéia específica, comigo, com aquele repertório… Aliás, a graça é exatamente essa (risos).
E no exterior? Argentina e Portugal, por exemplo. Aliás, o disco foi lançado primeiro em Portugal...
AC: Há especificidades nesses públicos que você menciona. Em Portugal, as pessoas falam e amam a língua portuguesa e eu me identifico com eles por esse amor. Já a platéia argentina é calorosa e inteligentíssima, embora haja o filtro da língua, que não é uma barreira, mas é um filtro, já que meu trabalho tem forte ligação com a palavra. Então, são diferentes as frequências das compreensões e incompreensões.
Fora a vida profissional, como é o seu dia a dia em casa? O que gosta de fazer nas horas de lazer?
AC: Gosto de ler poesia, tenho gostado mais e mais de cozinhar e passo o dia surfando na internet se puder.
O que ouvia na infância?
AC: Eu ouvia música com meus pais, a música que eles ouviam: Astor Piazzolla, Chet Baker, Miles Davis, Satie, e com minhas babás e empregadas ouvia rádio AM, Jerry Adriani, Wanderlei Cardoso, Roberto Carlos. Considero privilegiada essa experiência no meu processo de formação.
E hoje, o que ouve quando está em casa?
AC: Gosto de ouvir os sons da floresta onde moro e ouço de tudo um pouco em termos de música. No momento, ouço os artistas que fazem rádio experimental, uns malucos americanos ou alemães, muito interessantes (risos).
Você tem quatro cachorros e três gatos. Qual é a sua relação com os animais?
AC: Tenho agora cinco cachorros e três gatos e não sei viver sem bichos. Sempre tive bichos por perto e são essenciais para o meu equilíbrio. Bichos não fazem julgamentos.
Você tem algum cuidado especial com a voz?
AC: Quando estou em turnê, minha voz tem prioridade máxima e tenho cuidados especiais porque o excesso de entrevistas pode desgastá-la, além das mudanças de temperatura de uma cidade para outra e da secura do ar dentro dos aviões. Cuidar da voz significa beber muita água na temperatura ambiente, fazer exercícios e vocalises diariamente, evitar telefone, álcool e dormir muito. Quando não estou em turnê, não faço nada disso (risos).
Como unir música com qualidade de vida?
AC: Acho que o segredo está na dosagem. Considero o excesso de música prejudicial porque o silêncio é muito importante e deve ser ouvido, mas viver sem música alguma pode ser triste e certamente empobrece o espírito.
Toma cuidados especiais com a saúde, como fazer uma alimentação adequada ou praticar exercícios?
AC: Tenho fases mais disciplinadas, outras menos, isso tem a ver com os ciclos de trabalho, com as viagens, as sessões de estúdio, depende do que é que estou fazendo. Mas tenho, em geral, uma alimentação equilibrada, não fumo, durmo no mínimo oito horas por noite e no verão nado diariamente.
Qual a sua dica para se ter uma boa qualidade de vida?
AC: Durma bem, respire com calma, beba muita água, leia boa poesia e tenha amigos de verdade.
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